segunda-feira, 18 de março de 2013

Ruas de Borges e de seus contemporâneos

Borges and his contemporaneous streets

Júlio Pimentel Pinto1

RESUMO

O texto discute a persistência da temática urbana nas vanguardas latino-americanas do início do século XX, identificando alguns signos da celebração da cidade na produção poética do período. Enfoca quatro autores, sendo dois brasileiros, Mário e Oswald de Andrade, e dois argentinos, Oliverio Girondo e Jorge Luis Borges, para encontrar consonâncias e dissonâncias na representação urbana.
Revista de História -  Unesp

Conformando uma Argentina leitora: educação pública, bibliotecas e mercado editorial entre fins do século XIX e meados do século XX1

Building a reading Argentina: state schools, libraries and the publishing market in late -19th century and in the first half of 20th century

Gabriela Pellegrino Soares2

RESUMO

Este artigo pretende lançar luz sobre políticas públicas de promoção da leitura que tiveram lugar na Argentina de fins do século XIX e primeira metade do XX, e sobre a forma como essas interagiram com o mercado editorial em desenvolvimento no país. A preocupação em cultivar e orientar desde cedo nos cidadãos a prática da leitura fez das crianças alvo privilegiado de iniciativas educacionais e editoriais, às quais dedicarei particular atenção.
Revista de História - UNESP

sexta-feira, 15 de março de 2013

Uma insólita visita: Fidel Castro no Chile de Allende1


An uncommon visit: Fidel Castro in Allende’s Chile

Alberto Aggio2

RESUMO

Este artigo busca expor sinteticamente o que foi a viagem que Fidel Castro realizou ao Chile em novembro de 1971, e também refletir a respeito tanto das estratégias políticas evidenciadas por Castro em sua estadia no Chile, quanto sobre as conseqüências que derivaram dessas estratégias para o processo conhecido como a "experiência chilena". Conclui afirmando que, se não se pode atribuir à visita de Fidel toda a confrontação que mais tarde iria se estabelecer no Chile, também não se pode isentar integralmente o dirigente cubano de uma certa responsabilidade quanto à situação que se impôs. Esta viagem de Fidel ao Chile de Allende foi uma viagem incomum, distinta de qualquer padrão diplomático, e abrigou silenciosamente uma profunda disputa política no interior da esquerda latino-americana que permaneceu por muito tempo desconhecida.

Palavras-chave: Fidel Castro; Salvador Allende; socialismo.

Revista de História da UNESP

O direito à identidade: a restituição de crianças apropriadas nos porões das ditaduras militares do Cone Sul

The right to identity: the restitution of appropriated children in the Southern Cone military dictatorships

Samantha Viz Quadrat1

RESUMO

O texto aborda a apropriação de crianças durante as últimas ditaduras militares no Cone Sul da América Latina, com destaque para as ações realizadas pela Argentina e Uruguai. Ao mesmo tempo, procura-se apontar a colaboração entre os governos na repressão aos oponentes políticos. Por um outro lado, o texto aponta as estruturas criadas pelos organismos de direitos humanos, com destaque para o trabalho das Abuelas de Plaza de Mayo, para localizar e restituir a identidade desses jovens. Por fim, o texto traça a importância desse ponto, não incluído nas leis de anistias, para a punição dos envolvidos com os crimes de violações dos direitos humanos.

Palavras-chave: Cone Sul; ditaduras; direitos humanos.
Revista de História da UNESP

Esperança radical e desencanto conservador na Independência da América Espanhola

Radical hope and conservative despair in the independence of Spanish America

Maria Ligia Coelho Prado1

RESUMO

Neste artigo analiso dois textos produzidos por José Bernardo Monteagudo, figura emblemática do movimento de independência na América do Sul, no qual expõe seus projetos políticos antes e depois de conquistada a emancipação. Se em 1809 era um "democrata fanático", em 1823 havia se transformado em convicto monarquista, justificando a exclusão dos indígenas do mundo da política.

Palavras-chave: independência da América Espanhola; José Bernardo Monteagudo; diálogos políticos.
Revista de História da UNESP

quinta-feira, 14 de março de 2013

KLAUS BARBIE: o ocaso do carrasco

Klaus Barbie, o açougueiro de Lyon, capturou Jean Moulin, o principal chefe da Resistência Francesa, mandou milhares de judeus para os campos de concentração e, depois da guerra, colaborou com a ditadura boliviana. Sádico e cruel, o oficial de Adolph Hitler executava com muito empenho as ordens de seus superiores.

Rémi Kauffer


Em 1935, Klaus Barbie ingressou na SS, atingindo em pouco tempo um posto de comando na tropa de Hitler. Em novembro de 1942, foi enviado a Lyon para chefiar a Gestapo na cidade francesa
Entre sua chegada a Lyon, no fim de 1942, e sua fuga precipitada diante dos exércitos aliados no verão de 1944, foi ele o caçador. Vinte meses de batidas, de perseguições, de armadilhas. O prazer de perceber a angústia em lábios que tremem, em joelhos vacilantes. Pois ele, o Obersturmführer das SS, número 272284, espécime eminente da raça dos senhores, não temia Deus nem o diabo. Fanfarrão, era visto percorrendo com freqüência as ruas de Lyon acompanhado de três ou quatro homens, não mais.

Nessa época, ainda não era chamado de o carrasco de Lyon - um achado do pós-guerra. Mas o Obersturmführer Klaus Barbie já tinha um considerável currículo como caçador. Clandestinos ligados a redes de resistência francesas ou britânicas, maquis, judeus - inclusive crianças, como em Izieu. Centenas de deportações raciais ou não, assassinatos, torturas, execuções. E o fino do fino, a captura dos chefes da Resistência - entre eles Jean Moulin, reunidos para designar o novo chefe do exército secreto - em Caluire, no dia 21 de junho de 1943.

Brutal, sádico, desprovido de escrúpulos: assim era Klaus Barbie. Um puro produto do fanatismo ideológico nazista, com seu desfile de racismo, de desprezo pelos seres inferiores. 

EUA protegem o nazista

A estada de Barbie em Lyon foi agradável. Depois da derrota do III Reich começam os dias penosos em que o caçador se faz caça, e o oficial das SS passa a se esquivar. Promovido a Hauptsturmführer (capitão) em novembro, o ex-chefe do Amt IV do KdS de Lyon retornou a uma Alemanha que, sob as bombas dos aliados, não pára de se encolher.
Barbie figura como criminoso de guerra no Central Registry of Wanted War Criminals and Security Suspects, o Crowcass, um arquivo organizado pelos aliados. Na lista dos agentes alemães que atuaram na França, criada pela polícia do exército francês, ele aparece com o nome de "Barbier".

Mas é preciso ter cuidado, pois uma guerra pode esconder outra, e a Segunda Guerra Mundial dá lugar à Guerra-Fria. Em abril de 1947, Barbie é recrutado em Munique por uma unidade especial do Counter Intelligence Corps americano. Os objetivos do CIC não eram a perseguição de criminosos de guerra, atributo de outro ramo da organização, mas a luta contra a espionagem soviética na zona de ocupação americana, a infiltração no KPD, o partido comunista alemão, e a obtenção de informações sobre o aliado francês - alvo de desconfianças.

Teria o ex-chefe do Amt de Lyon relatado a seus superiores americanos o martírio de Jean Moulin, o representante pessoal do general de Gaulle na França ocupada, e de seus camaradas de Caluire? É pouco provável. Mas por que não mencionar as operações que efetuou em maio de 1944? Com as informações de um agente duplo, o franco-alemão Lucian Wilhelm Iltis, responsável pelo aparelho clandestino da Internacional Comunista e simultaneamente informante da Gestapo de Estrasburgo, Barbie desarticulou o estado-maior da resistência militar comunista da zona sul da cidade em apenas três dias. 

Cerca de 40 dirigentes, dezenas de franco-atiradores e de combatentes caíram na armadilha nazista apenas um mês antes do desembarque na Normandia: um exemplo eloqüente de eficiência, apropriado para ser exposto a seus interlocutores - e logo patrões - americanos.

Vida na Bolívia

No começo de 1951, depois de cinco anos de bons e leais serviços, Klaus Barbie e sua família seguem a linha dos ratos, esta sucessão de etapas que conduz antigos nazistas para a América do Sul. É na Bolívia que ele se instala, um país de 3 milhões de habitantes, onde os imigrantes alemães são tradicionalmente numerosos. Naturalizado boliviano em outubro de 1957, sob o falso sobrenome de Altmann, começa a engordar seu patrimônio. Acolhe com fleuma a visita oficial do general de Gaulle em setembro de 1963. Por que deveria inquietar-se, já que o presidente francês, em seus projetos de reaproximação com a Alemanha Federal, já libertou seus dois ex-chefes, os generais Oberg e Knochen? Dois meses mais tarde, o exército francês, tendo localizado Barbie em La Paz, solicita que o Sdece, os serviços especiais franceses, se ocupem do caso, mas o pedido não dá resultados.
Em 1966, o ex-agente das SS número 272284 começa a lidar com armamento naval. Com o apoio do general-presidente Barrientos, ele cria a Transmaritima Boliviana, uma sociedade da qual possui 49% das ações (os 51% restantes pertencem ao Estado).
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Revista História Viva

Caneca, nosso primeiro padre guerrilheiro

Frei Joaquim do Amor Divino Caneca levou o liberalismo aprendido no Seminário de Olinda às últimas consequências. Contra o autoritarismo de d. Pedro I, pegou em armas, e pagou com a vida pela rebeldia

Ricardo Maranhão

Nenhum carrasco habilitou-se a executá-lo. Nem mesmo em troca da liberdade, presidiário algum aceitou a tarefa. A execução de frei Caneca (detalhe), óleo de Murilo la Greca
Cadeia pública do Recife, 10 de janeiro de 1825. Um homem é condenado à forca, em sentença lavrada por comissão militar nomeada pelo imperador d. Pedro I. A forca está levantada no patíbulo, o condenado já rezou, já se confessou, já adquiriu a serenidade diante do inevitável. Só falta o carrasco. 

A autoridade militar está em busca de um carrasco, que não aparece, pois não há quem queira executar aquele condenado. Manda-se chamar um preso comum, um mulato recrutado às pressas com promessas de benefícios. Mas o mulato não quer enforcar o condenado, mesmo sofrendo ameaças e sendo espancado a coronhadas pela soldadesca.

Nos dias 11 e 12 a tensão da espera continua. Mais um negro, igualmente espancado, e mais outro, igualmente torturado, se recusam a enforcar aquele homem que espera em sua cela. Do lado de fora da prisão, muita gente pede clemência para o condenado. Petições, passeatas de ordens religiosas, nada demove a vontade imperial de executar aquele homem querido e respeitado, e não há carrasco disposto a enforcá-lo. Trata-se do revolucionário liberal Frei Joaquim do Amor Divino Caneca. 

O PANFLETÁRIO

Nascido em Recife em 1799, de origem humilde, Joaquim do Amor Divino vendia canecas nas ruas do Recife quando garoto, daí a origem de seu nome eclesiástico quando se tornou frade carmelita. Educado no Seminário de Olinda, centro de difusão de idéias liberais, tornou-se um dos mais combativos lutadores pela independência e pela república nos anos de 1817 a 1824.
Caneca participou da revolução de 1817, momento decisivo da efervescência política do Nordeste pré-independência, e amargou anos de cadeia por isso. Libertado em 1821, no bojo da luta final pela independência, concretizada no ano seguinte, como inúmeros políticos brasileiros ele passou a concentrar sua atenção na discussão do projeto da Carta Constitucional do nascente Estado. 

NO RECIFE, AS TROPAS INGLESAS MASSACRARAM INDISCRIMINADAMENTE A POPULAÇÃO E INCEDIARAM PARTE DA CIDADE

Mas, depois de nove meses de trabalhos que agitaram o ano de 1823, a Assembléia Constituinte, que daria forma ao regime brasileiro, foi fechada por d. Pedro I, numa crescente afirmação de autoritarismo. As vozes de protesto contra a arbitrariedade ecoaram por todo o país, principalmente no Nordeste. Ali, o fogo revolucionário aceso em 1817 havia deixado fortes brasas, estimuladas novamente pelo gesto do imperador. 

Durante 1823 e 1824, em Recife, vibrou nos ânimos populares a ação de dois jornalistas - ideólogos do movimento -, Cipriano José Barata e Frei Caneca. Em seu jornal Tífis Pernambucano, cujo primeiro número data de 25 de dezembro de 1823, Caneca analisava com ácidas críticas os recentes atos do imperador, e conclamava os pernambucanos à revolta.
Revista História Viva

Às armas, cidadãos. Com os hoplitas, os gregos formam um exército constituído de cidadãos livres.

A chegada do hoplita, soldado da infantaria que deve seu nome ao escudo que carrega, causou uma revolução. Privilegiou o choque frontal trazido pela falange em detrimento dos ataques rápidos e breves. A Grécia formou um exército de cidadãos livres e não mais de mercenários ou de escravos.
por Laurent Henninger


Os hoplitas combatiam em conjuntos de milhares de guerreiros, postos em formação tática disciplinada, armados com espadas e lanças, muito bem protegidos. Com este modelo de exército, a vitória passou a ser um feito coletivo, ao contrário da antiga formação aristocrática, que a considerava um feito individual
Há uma dezena de anos, o mundo dos especialistas em Antiguidade grega foi abalado pelo trabalho de Victor Davis Hanson, professor da Universidade da Califórnia. Desde então, as polêmicas não cessaram de circular ao redor das hipóteses e idéias apresentadas no livro O Modelo Ocidental da Guerra, com um subtítulo mais explícito: A Batalha da Infantaria na Grécia Clássica. Examinando de perto o sistema político-econômico das cidades gregas e as narrativas das batalhas de época, o historiador propõe uma teoria que é, desde então, adotada por quase todos os especialistas anglo-saxões em questões militares. Hanson testou suas hipóteses exaustivamente: seus estudantes na Universidade da Califórnia vestiram réplicas de armaduras gregas de metal e, sob o sol do deserto californiano, fizeram exercícios com armamentos de bronze pesando até 35 kg.


Existiria assim um "modelo ocidental de guerra", e os gregos dos séculos VIII e VII a . C. seriam seus inventores. Este modelo se resume da seguinte forma: preferência clara, às vezes dominante, pelo choque frontal e pela batalha decisiva; vontade de obter um resultado claro em prazos reduzidos; vontade de marcar uma separação clara entre o amigo e o inimigo de um lado, e, de outro, o tempo da guerra e o da paz.

Já se sabia que cada povo, cada civilização, possui uma forma particular de fazer a guerra. Os cronistas sempre insistiram neste ponto, e os trabalhos dos antropólogos contemporâneos apenas confirmaram este saber empírico. Mas um "modelo ocidental da guerra", sobretudo aquele que interessava a Hanson, supõe ser comum a um número considerável de civilizações, por vários milênios. Temos, então, o direito de nos questionarmos e de usarmos de prudência intelectual. De fato, não estamos apenas diante de uma arte da guerra tal como praticada por um povo bastante estabelecido em uma época precisa e limitada, pois, segundo nosso autor, os gregos das cidades antigas inventaram um modelo de guerra que foi adotado posteriormente por todas as civilizações ocidentais, de forma mais ou menos consciente. Modelo que encontra, assim, sua conceituação teórica com os escritos militares do general prussiano Carl von Clausewitz, nos primeiros decênios do século XIX, empregados nas hecatombes da Primeira Guerra Mundial.

A tese de Hanson é de extrema importância, não somente porque propõe uma grade de análise de vários milênios de arte da guerra, o que não é pouco, mas ainda porque pretende provar que a "matriz" do Ocidente, que foi a civilização das cidades gregas da era clássica, não deu origem somente aos modelos nos campos político, filosófico, científico e artístico, o que é normalmente admitido há séculos e constitui até mesmo uma espécie de clichê, mas também no campo militar. Será preciso, então, colocar o hoplita grego ao lado de Péricles, Demóstenes, Platão e Aristóteles, como figura fundadora da nossa civilização ocidental.
Revista História Viva

Diante de seus juízes, Jesus se cala

Jesus teve um processo justo? Do ponto de vista estrito do direito romano, não há nenhuma ressalva a fazer sobre a forma como a audiência transcorreu. Esclarecimento sobre os atores do drama.

Yann Le Bohec

A coroação de espinhos. Óleo sobre tela de Franco Velasco, c. 1819.
No Direito romano, um processo é uma peça modesta encenada por três atores apenas: o acusador, o acusado e o juiz. No caso de Jesus, o acusador é, de fato, uma coletividade, que constitui uma pessoa moral, "os grão-sacerdotes e os anciãos do povo" (Mateus, 26, 3). Esses personagens são cortejados pelo Estado romano que apóia sempre e em toda parte os notáveis, mas, ao mesmo tempo, desprezados porque são judeus, isto é, pertencem a um povo vencido.

O acusado, Jesus, pertence à categoria dos "peregrinos": homem livre, ele não possui cidadania romana. Para os romanos, ele não passa de um vagabundo judeu, o que o torna duplamente indigno porque não exerce nenhuma profissão e é - de resto, como seus adversários - descendente de vencidos.

O juiz chama-se Pôncio Pilatos. Esse personagem histórico, bem conhecido aliás, exerce a função de governador da Judéia: encontrou-se uma inscrição mencionando seu nome na construção de um santuário em homenagem ao imperador Tibério (14-37 d.C.). Recrutado entre os cavaleiros, ele é mais versado na arte da guerra e das finanças do que nos assuntos de justiça. Além disso, para tomar suas decisões ele é assistido por um conselho formado de especialistas que não aparece nos Evangelhos seja porque o julgamento não é difícil de sentenciar, seja porque essa instância não desempenhou um grande papel nesse caso. Testemunhas podem ser intimadas; elas constituem, na verdade, o coro dessa tragédia.

Muitas instituições de hoje em dia não existiam no mundo romano, em particular, a polícia, o juiz de instrução e o ministério público (o procurador geral). Dessas ausências decorrem várias originalidades no processo judicial romano. Por exemplo, quando um cadáver era descoberto na rua, ninguém prevenia a polícia, que não existia, e ninguém confiava o caso a um juiz de instrução, que também não existia. Conforme a tradição, os passantes procuravam identificar a vítima e prevenir a família. Era ela que realizava a investigação e que indicava ao juiz a pessoa que considerava culpada. Compreende-se, portanto, que um homem sem família jamais seria vingado se fosse morto. Em seguida, o acusador devia convocar o acusado a se apresentar ao juiz e precisava obrigá-lo, se preciso, pela força, a comparecer perante a justiça. Em geral, as pessoas convocadas para um processo compareciam: não comparecer significava reconhecer a culpabilidade e, portanto, incorrer numa condenação.
O processo de Jesus é, a esse respeito, muito interessante. Os grão-sacerdotes e os anciãos do povo queriam arrastá-lo para o tribunal do governador. Era preciso primeiro encontrá-lo e foi aí que Judas interveio: por trinta denários, prometeu entregá-lo a eles. Disse-lhes que Jesus se retirara para o jardim de Gethsêmani e o indicou para seus contratadores. Esses enviaram seus homens para prendê-lo: "Falava ainda, quando chegou Judas, um dos doze, e com ele uma grande turba, com espadas e bastões, mandada pelos grão-sacerdotes e pelos anciãos do povo" (Mateus, 26, 47). Um de seus amigos tenta defendê-lo e fere um dos atacantes. Mas Jesus se recusa a ser socorrido por meio da violência: "Aquele que empunhar a espada, perecerá pela espada." Todo esse processo está conforme com o direito romano. Em alguns casos, os magistrados municipais enviavam seus escravos, por exemplo, para prender um homem que estivesse fazendo escândalo numa taverna. Ou então, recorriam a milícias locais, a associações de filhos de ricos, os juvenes, que ajudam voluntariamente na manutenção da ordem. Em situações excepcionais, o exército intervinha. Para os soldados se mexerem, era preciso que bandidos estivessem submetendo uma região Nesse caso, a intervenção se caracterizava por sua brevidade e dureza. Mas cada governador possuía uma guarda de honra que lhe permitia, em caso de necessidade, garantir as funções de polícia.

No começo, os romanos proibiam a profissão de advogado. Mas ninguém podia impedir um acusado de pedir a um bom orador, um bom conhecedor do Direito, de o ajudar "amigavelmente" em troca de um "presentinho." Foi assim que Cícero adquiriu celebridade e uma sólida fortuna. Plínio o Moço também advogava bastante: em sua correspondência, que data do início do século II de nossa era, ele menciona freqüentemente os casos em que interveio. Mesmo quando a profissão de advogado foi finalmente reconhecida, era preferível defender-se sozinho: era o indício de que não se tinha nada a temer.

Um dos processos mais conhecidos da Antigüidade teve como cenário Sabratha, na atual Líbia, e se desenrolou por volta de 158. O jovem Apuleio, celebrizado posteriormente como romancista, foi acusado por um membro da família de sua mulher de ter recorrido a práticas mágicas para seduzir aquela que se tornara sua esposa, uma mulher bem mais rica e mais idosa do que ele.
Revista História Viva

Aton, o primeiro deus único do Egito

Há mais de três mil anos, todas as divindades egípcias foram substituídas por um deus único, Aton, o disco solar irradiante, símbolo da vida, do amor, da verdade, arruinando o clero todo-poderoso de Tebas.

Claudine Le Tourneur d\\`Ison

As representações mostram Nefertiti e Akhenaton de forma excêntrica, em sintonia com o espírito inovador do casal
Na história do Egito antigo, não há casal mais sedutor do que o rei Akenaton e sua esposa Nefertiti, no século XIV AC. Por mais excêntricas que fossem suas representações, a sedução não se limita aos seus aspectos físicos. 

Ambos tornaram-se personagens simbólicos da civilização egípcia por terem sido a origem do único cisma profundo conhecido pelo Egito no decorrer de seus três mil anos de história. Destituindo o todo poderoso clero de Amon para impor um deus único, representado pelo disco solar Aton, Akenaton abria pela primeira vez na história da humanidade um caminho rumo ao monoteísmo.

O reinado deste faraó, por muito tempo erroneamente qualificado como "herético", situa-se no fim da efervescente XVIII dinastia, por volta de 1358 AC. A civilização se encontra em plena apoteose. O Egito jamais teve tamanha opulência e refinamento. Após as grandes conquistas de Tutmósis III, o momento é de paz. Amenófis III, pai de Akenaton, soube estender pelo Oriente o poder e o brilho de Tebas, centro de um grande império internacional. 

O deus Amon é venerado. O clero de Tebas está mais onipotente e mais onipresente do que nunca, constituindo um verdadeiro Estado dentro do Estado. Esta situação já havia preocupado diversos soberanos que, em vão, haviam tentado reduzir as ambições políticas dos chefes religiosos. Amenófis III tem consciência do perigo que este contra-poder representa para a realeza.
Desde a descoberta de seu palácio, construído na margem oeste do Nilo, longe de Karnak, o que não era habitual, alguns pesquisadores lançaram a hipótese de uma ruptura voluntária com o clero de Amon. De fato, o nome do palácio significa "A casa de BebMaât-Rá é o disco resplandecente", associando plenamente o soberano ao deus. Tiya, esposa de Amenófis III por trinta anos, já venerava o disco solar Aton mais do que Amon, o deus oficial. 

Na educação dada a seu filho, o futuro Akenaton, ela pregava com força o culto deste deus cujo ideograma reflete a natureza: o olho de um deus celeste, cujo círculo evoca a íris e o ponto central a pupila. É ela quem, uma vez criada a cidade de Akenaton, preferiu permanecer em Tebas para manter o elo entre o clero de Aton e o de Amon, a fim de evitar a invasão popular.

Para o egiptólogo Alexandre Varille, "a revolução de Akenaton foi mais uma reação contra o poder temporal de Amon do que uma modificação profunda da religião. O famoso hino ao sol de Amarna exprime a mesma filosofia unitária de múltiplos textos do mais antigo Egito". Desde o início do período histórico, a religião já estava bastante instituída, refletida e ordenada pelos teólogos. Apresenta uma uniformidade encontrada durante três milênios. 

Esta harmonia intelectual se traduz por uma reflexão teológica jamais interrompida, cuja inspiração jorrava sem cessar de suas próprias fontes. Por exemplo, os textos religiosos gravados nas pirâmides da V e VI dinastia são copiadas nas tumbas do Médio Império e na época da XXVI dinastia, sendo ainda utilizados. Este caráter ímpar pode surpreender tanto que se tem a impressão de lidar com um amálgama de divindades provenientes de todas as regiões do Egito.
Revista História Viva

Biografia Freud: Segredos de Família

O fundador da psicanálise se revela um patriarca exigente e tirânico, cuja vida foi semeada por relações passionais e rompimentos conturbados.

Jean-Pierre Bourgeron

BETMANN/CORBIS/STOCK PHOTOS
Com o charuto, a mais famosa foto do pai da psicanálise (1922)
"Judeu, venha até aqui, gritou o cristão, após haver jogado o meu boné de pele na lama". "E o que o senhor fez?", pergunta o jovem Sigmund a seu pai Jacob. "Apanhei meu boné", responde o pai. Essa cena incomoda a criança, que prefere substituí-la na imaginação pela história de Amílcar, obrigando Aníbal, seu filho, a jurar que o vingaria dos romanos. 

Freud conta esta anedota em sua obra Interpretação dos Sonhos, publicada em 1900. Ela o marca de tal forma que, doravante, ele se torna o herói que ultrapassa o pai humilhado. Igualmente, ele vive sem religião, sem, porém, renegar seu judaísmo.
Sigmund Freud nasce na Morávia, em Freiberg, em 8 de maio de 1856. O pai, Jacob Freud, comerciante de tecidos, casa-se com Amalia Nathanson, em terceiras núpcias. 

Com ela, tem outros sete filhos, depois do pequeno Sigmund. Mesmo sendo o mais velho desta irmandade, Freud já tem dois meio-irmãos mais velhos, nascidos do primeiro casamento de Jacob.

Originária da Renânia, região alemã banhada pelo rio Reno, a família refugia-se na Áustria para fugir das perseguições anti-semitas. Dramas e incidentes marcam o menino. Quando estava com 19 meses, morre seu irmãozinho Julius, 11 meses mais novo. Pouco tempo depois, em 1858, nasce a irmã Anna. Como companheiro, ele tem o sobrinho John, um ano mais novo, filho de seu meio-irmão Emannuel.

O grande choque é a saída de Freiberg, em 1859, para Leipzig, e, mais tarde, para Viena. Freud sofre dolorosamente com as emigrações. A viagem é de trem. Mais tarde, o doutor Sigmund Freud evocará longamente sua fobia por estradas de ferro.


Freud revê os manuscritos de Moisés e o Monoteísmo, publicado em 1939.
Quando ele está com três anos, a família instala-se em Leopoldstadt, o quarteirão judeu de Viena, numa residência na Weissgärberstrasse. É na casa que, aos oito anos, ele vive uma experiência marcante: ao urinar no quarto dos pais, Jacob berra com o menino: "Este garotinho não será nada na vida!". Sigmund faz de tudo para provar que o pai estava equivocado. Aluno brilhante, lê muito, e apaixona-se pela história da França, ainda que seus autores prediletos sejam Goethe, Schiller, Homero, Shakespeare. Por ocasião da Exposição Universal de Viena, em 1873, ele descobre as teorias de Darwin e o ensaio de Goethe "A Natureza", que o leva a optar pela medicina. O funcionamento das células nervosas das enguias machos de água doce: este o tema de sua primeira publicação, em 1877. Estamos distantes dos problemas da psique, da libido e do inconsciente. O encontro com Marta Bernays é determinante para mudar a orientação de sua carreira. Após ter sido zoólogo, ele se torna fisiologista e pesquisador. Pensa em se casar com Marta, por quem se apaixona loucamente, porém, considera pouco satisfatória a sua situação financeira. Ingressa, então, no Hospital Geral de Viena, onde, em 1885, obtém o diploma em neurologia.
Logo em seguida, fica obcecado pela idéia de ir a Paris e seguir os cursos de Charcot, no Hospital de la Salpêtrière. Consegue, então, uma bolsa de estudos e segue para a capital francesa. 

De Paris, escreve para Marta: "Charcot, cujo cérebro beira à genialidade, está prestes a demolir minhas concepções e meus desígnios. Terminada a aula, saio de lá como se estivesse saindo de Notre-Dame, cheio de idéias novas sobre a perfeição."

De volta a Viena, descreve a histeria masculina perante a Sociedade de Medicina. Um integrante da augusta instituição o aparteia: "Parece um conto de fadas científico", e abandona o recinto. Este episódio leva Freud a refletir e, em conseqüência, a abandonar suas teorias sobre o assunto.
Entre 1892 e 1895, Freud começa a explorar os caminhos que acabam se tornando os alicerces da psicanálise. Dois de seus amigos médicos, Josef Breuer, um dos raros a ajudá-lo durante os estudos universitários, e Wilhelm Fliess, instalado em Berlim, estão na origem desta formidável descoberta.

Breuer entrega a Freud o caso de uma paciente, conhecida pelo pseudônimo de Anna O., considerada gravemente histérica. Anna O. é submetida à hipnose para ser liberada de seus traumas. O caso é relatado por Freud e Breuer em Estudos sobre a Histeria.
Wilhelm Fliess, por sua vez, acompanha as conferências de Freud sobre o sistema nervoso e mantém longa correspondência com ele. Nessa troca de cartas, Fliess expõe algumas de suas teorias, como a da bissexualidade nos seres humanos, o complexo de Édipo, as neuroses e a etiologia sexual.
Em Viena, publica suas observações. Às vezes, a correspondência torna-se mais íntima, a ponto de certas pessoas não hesitarem em afirmar que Freud estava enamorado por Fliess.
Revista História Viva

Dossiê Napoleão: A segunda morte do Imperador

Napoleão repousa no Museu dos Inválidos? O escritor Georges Rétif acredita que ele foi envenenado pelos ingleses, que teriam substituído seu corpo no caixão para ocultar o assassinato.

Bruno Roy-Henry


Pomo da discórdia: O corpo que está na tumba do Museu dos Inválidos talvez não seja o do imperador
Santa Helena, 15 de outubro de 1840, cerca de 13 horas. Os generais Bertrand e Gourgaud, Emmanuel de Las Cases e os antigos servidores de Napoleão Bonaparte prendem o fôlego: o que irão descobrir no momento da retirada da tampa da urna funerária? Os 19 anos passados não teriam transformado o corpo num esqueleto hediondo? Não! Para surpresa geral, os restos de Napoleão aparecem milagrosamente conservados.

Em 15 de dezembro de 1840, a França organiza o retorno solene dos restos mortais de seu imperador, na presença do rei Luís Felipe, das autoridades de Estado e daqueles que continuavam fiéis a Napoleão Bonaparte.

Cento e vinte e nove anos mais tarde, em 1969, cabe à República, presidida por Georges Pompidou, conferir pompa à comemoração do bicentenário do nascimento de Napoleão. E é este o momento escolhido pelo escritor Georges Rétif de la Bretonne para escandalizar a opinião pública com sua obra Anglais, rendez-nous Napoléon!, na qual afirma que restos de imperador não repousam no Museu dos Inválidos. A afirmativa é imediatamente refutada pelo coronel MacCarthy, na época curador do Museu dos Inválidos.

A tese de Georges Rétif assim pode ser resumida: os companheiros de Napoleão, não desejando que sua fealdade física fosse legada à posteridade, decidem, depois de informar o governo britânico, substituir a máscara mortuária do herói pela de Cipriani Franseschi, mordomo da casa de Longwood, em Santa Helena, morto em fevereiro de 1818.
A partir desta idéia, o governo inglês acredita que pode levar a fraude adiante substituindo, sem riscos, os restos de Cipriani pelo corpo do imperador. Assim, os despojos de Napoleão foram transferidos para a Inglaterra - onde ainda estariam. Os companheiros de Bonaparte presentes, cúmplices agora, não podem protestar no momento da abertura do caixão, em 15 de outubro de 1840.

Um dos argumentos mais perturbadores apresentados por Georges Rétif recai sobre o estado de conservação do corpo, na exumação realizada em 1840.

Segundo testemunhas, o imperador estava perfeitamente reconhecível, como se tivesse sido mumificado. Ora, seu cadáver fora hermeticamente fechado em um caixão de folha-de-flandres, em 7 de maio de 1821, mais de 49 horas após o óbito. O coração e o estômago foram extraídos no momento da autópsia realizada pelo doutor Antommarchi.

Segundo as testemunhas do sepultamento - Marchand, criado de Napoleão, o general Bertrand, o conde de Montholon e alguns oficiais ingleses -, o corpo do imperador exalava um odor horrível, e seu rosto já estava desfigurado, sinais clássicos de putrefação. O processo de degradação dos tecidos poderia ter sido interrompido a ponto de, aproximadamente 20 anos mais tarde, nos encontrarmos diante de um corpo quase intacto? A ciência médico-legal poderia explicar a interrupção, quase instantânea, da decomposição de um cadáver?

Dentre os pareceres que chegaram a mim, em primeiro lugar é necessário lembrar a avaliação do doutor Vignolles, já falecido, que me escrevia em 1989: Efetivamente, a aparente conservação do corpo de Napoleão traz alguns problemas médico-legais [...]. Entretanto, [...] considero quase impossível que os restos mortais do imperador pudessem estar suficientemente conservados a ponto de serem reconhecidos 20 anos depois. Mais tarde, Vignolles acrescentaria: Contudo, me parece que, frente à precisão dos depoimentos, aqueles que assistiram à exumação de Napoleão estavam na presença de um cadáver previamente ?tratado? (para não dizer mumificado).
Seria ótimo se a medicina legal nos desse uma solução incontestável. Todavia, alguns contestam o estado de putrefação inicial. O doutor Chatenet, médico legista e perito do tribunal de apelação de Poitiers, conclui pela adipocera precoce. Trata-se de um processo de saponificação, pelo qual as gorduras transformam os tecidos em uma espécie de sabão. Muitos indícios levam a esta hipótese, como observa o doutor Chatenet, mas a descrição surpreende pela ausência total de modificação, 19 anos depois. A pele, no caso de adipocera, é marrom, freqüentemente grossa e ?cartonada?. Nada disso ocorre com o corpo exumado de Santa Helena.

Putrefato em 1821, reaparece o corpo em bom estado em 1840

Poderia tratar-se de mumificação? É uma possibilidade. Sob esse prisma, o doutor Chatenet examina a hipótese de o corpo de Napoleão ter sido objeto de embalsamamento sem o conhecimento das autoridades britânicas. Conseqüentemente, é necessário convir que a adipocera é o fenômeno bioquímico que melhor explica a conservação do corpo do imperador.

Resta uma hipótese, considerada pelo doutor Chatenet: o corpo de Napoleão, previamente impregnado de substâncias que contêm arsênico, não sofreu nenhuma putrefação. Hipótese que põe em evidência o dossiê sobre o envenenamento de Napoleão Bonaparte. Ele foi envenenado com arsênico, fato que explica a surpreendente conservação de seu cadáver. Tese reforçada por Ben Weider, responsável pela análise realizada nos laboratórios do FBI ? a polícia federal americana - dos cabelos de Napoleão, retirados em Santa Helena antes e depois de sua morte. Não se pretende reabrir esse dossiê. Notemos que o suposto envenenamento forneceu motivo para as autoridades inglesas substituírem o cadáver.

Entretanto, algumas explicações do coronel MacCarthy são aceitáveis. Às vezes, Rétif de la Bretonne força um pouco a dose. É o que acontece com a famosa distorção observada entre a descrição do sepultamento, que menciona apenas três tampas, e a presença devidamente comprovada de quatro tampas no momento da exumação. Nesse ponto, o militar parece ganhar do escritor. Em contrapartida, a descrição feita por Marchand e Antommarchi da forma como estava vestido o corpo de Napoleão é objeto de controvérsias.
Sabemos que o imperador foi sepultado com a farda habitual de coronel dos Caçadores da Guarda, com o grande colar da Legião de Honra, a cruz de oficial em ouro, a coroa de louros e a cruz da Ordem da Reunião. Os detalhes da vestimenta parecerão fastidiosos ao leitor, mas são essenciais para a compreensão da seqüência.
Revista História Viva

quarta-feira, 13 de março de 2013

Dossiê Egito: O Berço dos Faraós

Precedida por uma dinastia que os arqueólogos convencionaram denominar "Zero", a história do Egito faraônico começa por volta de 3150 a.C. com o rei Menés.



Período tinita (cerca de 3150 a.C. a 2700 a.C.) - I e II dinastias
A história do Egito faraônico começa com o rei Menés, responsável pela unificação entre o Alto e o Baixo Egito e pela fundação de Mênfis, a capital do Império. Interlocutor dos homens com os deuses, Menés ostenta a coroa branca do Alto Egito (hedjet) e a coroa vermelha do Baixo Egito (deshret).

Antigo Império (por volta de 2700 a.C. a 2140 a.C. ) - III e IV dinastias
Nesta época, o Estado egípcio se desenvolve consideravelmente e a sua administração centraliza-se na figura do faraó, que passa a ser venerado como verdadeiro deus. Djoser inaugura a III dinastia (cerca de 2700 a.C.). Seu conselheiro, o arquiteto Imotep, constrói a pirâmide em degraus de Saqqara, a primeira tumba real com essa forma arquitetônica. 

A IV dinastia é marcada por reinados nos quais foram construídas as três grandes pirâmides de Gizé - Queóps, Quéfren e Miquerinos. Esses complexos funerários são o símbolo de um Estado forte e de uma civilização avançada. 

É na V dinastia (aproximadamente 2480 a.C. a 2330 a.C.), originária de Heliópolis, que se verifica o culto ao Sol, o que não significa a rejeição aos outros deuses. O faraó é agora o "filho de Rá", o deus-sol. 

Pepi I, representante da VI dinastia, reina por mais de 50 anos. Ele é também um grande construtor de pirâmides (Bubastis, Abydos, Dendérah). Pepi II sobe ao trono aos seis anos de idade e nele permanece por 94 anos.

Primeiro período intermediário (por volta de 2140 a.C. a 2040 a.C) - VII-X dinastias
Uma revolução, seguida pela invasão de povos asiáticos, põe fim à VI dinastia. Porém, nenhum nome dos reis da VII dinastia é conhecido. A VIII dinastia, a menfita, cuja capital era Mênfis, demonstra os sinais da decadência política do Egito. O país é dividido em três: o Delta, o Egito Médio - cujo centro político era Heracléopolis - e o Alto Egito, agrupado em Tebas. Inicia-se um período de anarquia e de recessão econômica (escassez de alimentos, desordem civil e violência). Uma série de conflitos ininterruptos entre as facções do sul (de Tebas) e do norte (Heracléopolis) ocorrem e cessam apenas na XI dinastia.



A grande pirâmide de Gizeh com a Esfinge
Médio Império (por volta de 2040 a.C. a 1750 a.C.) - XI e XII dinastias
Mentuotep II, rei de Tebas, reunifica o Egito (aproximadamente em 2020 a.C.). Mas são os soberanos Amenemés e Sésostris (XII dinastia, por volta de 1900 a.C. a 1790 a.C.) que conduzem o Império ao seu apogeu. A expansão comercial abre-se para o mar Vermelho, mar Egeu, Fenícia, Núbia e Delta, e o país conhece a prosperidade econômica. Dessa época, há vários manuscritos literários, textos de instruções, profecias e contos.
Revista História viva